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19 de Abril de 2024
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    Seminário discute racismo estrutural e soluções de combate à discriminação

    Por Ademar Lopes Junior

    O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, por meio de seu Comitê de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação, a Escola Judicial da 15ª, o Ministério Público do Trabalho da 15ª e a 3ª Subseção Campinas da Ordem dos Advogados do Brasil, promoveram o Seminário "Racismo Estrutural", que reuniu na sexta-feira, 28/6, cerca de 350 pessoas no Plenário Ministro Coqueijo Costa do edifício-sede da Corte, em Campinas. O evento contou com magistrados, procuradores, advogados, servidores, professores, estudantes, além de representantes de entidades de classe e organizações não governamentais em defesa dos direitos humanos e combate à discriminação.

    A vice-corregedora da 15ª, desembargadora Maria Madalena de Oliveira, representando a presidente da Corte, desembargadora Gisela Rodrigues Magalhães de Araujo e Moraes, compôs a Mesa Alta ao lado do desembargador Eduardo Benedito de Oliveira Zanella, presidente do Comitê de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação, da procuradora-chefe do MPT-15, Maria Stella Guimarães de Martin, da diretora da Ejud, desembargadora Maria Inês Corrêa de Cerqueira César Targa, do presidente da Câmara Municipal de Campinas, Marcos Bernardelli, do vereador Carlos Roberto de Oliveira (o Carlão do PT), da secretária municipal de Assistência Social de Pessoas com Deficiência e Direitos Humanos de Campinas, Eliane Jocelaine Pereira, representando no ato o prefeito Jonas Donizette, da procuradora do trabalho e coordenadora nacional de Promoção de Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação do Trabalho do MPT, Valdirene Silva de Assis, da procuradora do trabalho e coordenadora regional de Promoção de Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação do Trabalho do MPT, Danielle Olivares Corrêa Masseran, e do diretor secretário-geral da OAB local, Cláudio Aparecido Vieira, representando no ato o presidente da OAB Campinas, Daniel Blikstein. Prestigiaram o evento também, entre outros, os desembargadores José Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, decano da Corte, e Lorival Ferreira dos Santos, presidente do TRT-15 no biênio 2014-2016.

    O servidor Cláudio Ventura Mendes e sua filha Vi Mendes abriram o evento com um número musical, de voz e violão, interpretando os clássicos "Sorriso negro", de Dona Ivone Lara, e "Olhos coloridos", de Osvaldo Costa.

    A desembargadora Maria Madalena ressaltou a importância do evento, que teve sua primeira edição no tribunal ainda na gestão do presidente Lorival Ferreira dos Santos, e destacou a necessidade sempre atual de defender os direitos dos negros e sua efetiva inclusão. A magistrada fez uma saudação especial à palestrante Eunice Prudente, de quem foi caloura no início dos anos 1970, na faculdade de Direito da USP (Largo São Francisco), e lembrou a atuação do ativista de direitos humanos Abdias do Nascimento e do sociólogo Clóvis Moura.

    O desembargador Eduardo Zanella falou do papel que o tribunal desempenha na discussão e defesa de questões sociais, por meio de seus comitês regionais de trabalho seguro, combate ao trabalho infantil e de erradicação do trabalho escravo. Para o magistrado, esse trabalho paralelo à função jurisdicional reforça a preocupação e a atuação da Justiça do Trabalho nas questões sociais e de defesa dos direitos humanos.

    A procuradora Maria Stella de Martin salientou a importância da parceria do TRT-15, MPT-15 e OAB na elaboração do seminário, e lamentou que nos dias atuais ainda haja pessoas que sofram com a discriminação.

    A diretora da Ejud, desembargadora Maria Inês Targa, criticou o racismo no Brasil, que se apresenta como fruto de uma cultura escravagista, e que exige uma revisão de conceitos e preconceitos de toda a sociedade.

    A procuradora Danielle Masseran afirmou a importância do seminário para a busca de soluções de combate à discriminação e lembrou que, apesar das garantias constitucionais e dos vários tratados internacionais dos quais o País é signatário, a sociedade brasileira ainda amarga expressivas diferenças na distribuição de renda e oportunidades, na qual os negros, que são maioria da população (54% dos brasileiros se afirmam negros, segundo dados do IBGE), estão inseridos entre os mais pobres, recebendo os mais baixos salários.

    O advogado Cláudio Vieira destacou a importância da resistência negra na luta pelos seus direitos, e apesar das dificuldades e ataques, ele se mostrou otimista com o futuro, especialmente pelo debate que se abre como no seminário promovido no TRT-15.

    A procuradora Valdirene de Assis ressaltou a representatividade como pano de fundo do seminário. Nesse sentido, ela destacou, por exemplo, a falta de representatividade dos negros na elaboração das leis do País, apesar de serem maioria da população.

    Racismo estrutural

    Esse foi o tema da primeira palestra do dia, ministrada pela professora doutora da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Eunice Prudente, que defendeu uma ação política e conjunta para o combate ao racismo no País. Segundo a palestrante, "as pessoas praticam naturalmente muitos atos discriminatórios", pelo fato até mesmo de os direitos humanos terem sido muitas vezes "romanceados". A professora lembrou que só a lei não é capaz de assegurar o fim do racismo estrutural, e prova disso, segundo ela, é que as políticas inclusivas ainda não foram efetivadas.

    Ao longo de sua exposição, a professora apresentou o racismo numa evolução histórica da legislação brasileira, na qual o negro sempre esteve à margem, desde as primeiras manifestações separatistas malsucedidas, de cunho nacionalista, em que os negros eram impedidos de pegar em armas, até o momento em que os escravos definitivamente lutam na Guerra do Paraguai, o maior conflito armado internacional ocorrido na América do Sul entre o Paraguai e a Tríplice Aliança, composta pelo Brasil, Argentina e Uruguai, de dezembro de 1864 a março de 1870. Anos depois do fim da guerra, coincidência ou não, o Brasil põe fim à escravidão negra (13 de maio de 1888), sendo o último país das Américas a libertar seus escravos sem, contudo, criar políticas de inclusão para os negros. Ao contrário, com o advento da República e até o governo de Getúlio Vargas, o estímulo à imigração, com preferência de pessoas com "ascendência europeia", reforça ainda mais o racismo estrutural.

    Em sentido contrário, em defesa dos negros no País, a palestrante destacou algumas manifestações, ainda no período colonial, como os quilombos, algumas irmandades católicas e a compra de alforrias, mais à frente a Imprensa Negra e a Frente Negra Brasileira (extinta pela ditadura Vargas em 21 de dezembro de 1937), ainda o Teatro Experimental do Negro e a Convenção Nacional do Negro em 1950 (primeira manifestação pela criminalização da discriminação racial). Em 1951, a Lei 1.390 (Lei Afonso Arinos) passa a tipificar a prática de racismo como mera contravenção penal, e a partir de 1969, quando o Brasil ratifica a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, da Organização das Nações Unidas, o País passa a se preocupar mais efetivamente com as políticas inclusivas. A Constituição Federal de 1988, ao elencar a "dignidade da pessoa humana" como um de seus fundamentos, também colaborou para a desconstrução do racismo. Por fim, o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010) marcou mais um passo na conquista dos direitos de inclusão dos negros no Brasil. Para Eunice Prudente, porém, o grande desafio atual no Brasil é a garantia mais do que o "mínimo existencial", com base na "reserva do possível", mas um valor suficiente para a efetiva garantia da dignidade humana, e da educação como fator de empoderamento da população negra, especialmente com a admissão e participação social, o direito fundamental à informação, a extinção da miserabilidade e a redistribuição de rendas e espaços.

    Trabalhadores negros e mercado de trabalho

    A segunda palestra do seminário, a cargo da professora Alessandra Benedito, coordenadora do Curso de Direito Mackenzie Campinas e doutora em Direito Político e Econômico, apresentou um panorama da realidade cruel e desigual dos negros no mercado de trabalho no País.

    Antes, porém, a professora aplicou um "teste de privilégios", no qual o público respondeu 35 questões sobre conteúdos comuns à vida das pessoas, num esquema de pontuação "mais um ou menos um". Mais que apresentação de dados da discriminação, o teste comprovou a realidade, revelando uma gritante diferença entre brancos e negros presentes ao evento, das condições que cada um desfrutou ao longo da vida, pondo em xeque a teoria da meritocracia num país tão desigual em oportunidades.

    A palestrante abordou os aspectos do custo para os negros de estarem fora do mercado formal de trabalho, particularmente os fatores que determinam a produtividade não inclusiva. Segundo ela, o racismo se revela na exclusão e falta de oportunidades educacionais, o que ainda é rotina para a população negra no Brasil. De acordo com o IBGE, entre 2005 e 2015, o percentual de negros universitários saltou de 5,5% para 12,8%. Nas empresas nacionais, porém, a presença de negros ainda é baixa. Dados do Instituto Ethos mostram que, mesmo representando mais de metade da população do País, as pessoas negras ocupam apenas 6,3% de cargos na gerência e 4,7% no quadro executivo. No caso das mulheres negras, apenas 1,6% estão na gerência e 0,4% no quadro executivo. No que se refere à diferença salarial, de acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, os negros ganham pouco mais da metade dos rendimentos de um branco (59%).

    A palestrante também sugeriu algumas propostas de combate ao racismo no Brasil, dentre elas, a educação inclusiva a fim de naturalizar o diferente, a difusão de novas concepções na gestão de pessoas e na cultura organizacional, o combate às dinâmicas de discriminação e desigualdade de gênero e raça praticadas no ambiente de trabalho, a promoção da igualdade de gênero e raça no que diz respeito às relações formais de trabalho e à ocupação de cargos de direção, a garantia da inclusão e possibilidade de ascensão de negros e negras no ambiente corporativo, e o estímulo ao empreendedorismo.

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